quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

"A VONTADE DE JUSTIÇA DE DEUS".



          Acredito que, de alguma maneira, Deus, nesses dias nos fala sobre a sua vontade de justiça. O Brasil, é um País de muitas desigualdades; A vontade de Deus, é a "justiça". Mais uma tendência natural é nos deixarmos arrastar por ideologias injustas. Deus, quer nos guiar pelas veredas da justiça. No (Sl-23:3), Davi nos afirma que Deus, em sua vontade deseja que andemos pelo caminho da justiça. A vontade de justiça de Deus, pode ser realizada através daqueles que se deixam guiar por ele. Em (Mt-5:10), Jesus coloca a vontade de justiça, como um sinal do Reino de Deus:"Bem aventurados serão aqueles que são perseguidos por causa da  justiça"

          O Brasil, é um País de grandes desigualdades; Desigualdade econômica, ou seja, na distribuição de renda; Conforme Marcio Pochmann (2006), há uma ditadura da concentração de renda. Os 10% mais ricos do Brasil, concentram 75% de toda riqueza; E os 90% mais pobres ficam com 25%. Desigualdade racial e de gênero, entre o negro, o branco, o pardo, homens e mulheres; A desigualdade racial, influencia diretamente no mercado de trabalho. O recebimento de recompensas, segundo alguns especialistas, não se baseiam em performances ou aquisição de capacidades, más nas ideias produzidas entre grupos sociais, com relação a diferença entre negro e branco, entre o homem e a mulher. E a desigualdade Regional, entre regiões, cidades e Estados; esta está nas diferenças estruturais entre sudeste, parte do centro-oeste, o sul do País, com maior desenvolvimento industrial, técnico e científico; Tendo em são Paulo, o polo mais alto em desenvolvimento; Enquanto que na região Nordeste, o desenvolvimento ainda é pontual. E ainda, o regional, é determinante ainda, para o acesso a oportunidades. Neste sentido, seguindo a lógica, de que há ideias que ideologizam o preto, o pardo, a mulher, percebemos que a população está distribuída regionalmente segundo a cor. A população branca, está concentrada nas regiões mais desenvolvidas; Enquanto, que os grupos pretos e pardos, se concentram na região Nordeste.

          A justiça Social no Antigo Testamento, é evidente; É algo cobrado por Deus; Principalmente á aqueles que dizem conhecê-lo. Podemos perceber o valor da justiça Social, no Antigo Testamento, tomando como referência o ministério do profeta Amós. Por que dentre tantos exemplos, o ministério do profeta Amós?. Por que não pegar alguém que saia de dentro de um contexto mais urbano; Que no caso, se adequa mais a realidade contemporânea?. Porque o profeta Amós, é talvez o modelo de profeta, mais adequado para falar a atual realidade; Cercada de interesses e mascarada pelas ideologias dominantes; Esta sim é a realidade contemporânea. O fato não era que ele não tinha "nada" a perder; Mais era que ele não tinha "muito" a perder. O modelo de profeta, em Amós, tem menos chance de se comprometer com a ideologia do poder. Em (Am-7:10-17), percebemos a aliança de Amazias, Sacerdote de Betel, com a ideologia da corte, da aristocracia. A teologia, já no antigo testamento legitima a injustiça Social; Ou seja, ela se associa a ideologia dominante. É verdade, que temos referência profética, como Isaías, que diferentemente de Amós, que era um camponês, era culto e ligado a nobreza, a corte, a aristocracia; Mais que não se partidarizava em favor da corte, mais a favor da justiça. Em (Is-1:10-20), Isaías, inspirado por um espírito de justiça, defende os órfãos, as viúvas, os oprimidos; Bem como denuncia os exploradores da corte, assim como também a máscara do clero. E é verdade que temos ainda hoje este tipo de caráter profético, mais são exceções raras; Geralmente é preciso não ter muito a "perder", para se comprometer com a verdade profética. Amós, hoje, pode ser o modelo de profeta eficaz, contra a injustiça. A partir do texto, (Am-7:10-17), ele representa alguém que está culturalmente a margem do sistema da corte. Há aqui, um preconceito a origem humilde do profeta. Ele representa o excluído, o marginalizado. No sistema de então, ali do contexto de Amazias, não pode um profeta com tal origem; Sociologicamente, sua permissão para a profecia, é apenas um discurso de inclusão. Dai Amazias, o sacerdote de Betel,  desclassificá-lo, desqualificá-lo, o chamando de conspirador contra a corte; Mandando-o assim profetizar lá em Judá; Claro como fugitivo, a margem; No seu devido lugar, no entendimento da mente ideologizada de Amazias. Mais nos (vs-14,15), Amós, se declara emancipado das tradições institucionais proféticas, dizendo ser ele, não profeta, não filho de profeta, mais um boieiro e agricultor, chamado por Deus, para profetizar a Israel. Existe três formas de exercer o ministério profético no antigo testamento:"Sendo aluno em uma escola-(2Rs-4:38); Sendo filho de um profeta-(Am-7:14), e sendo chamado por Deus-(Jm-1:5). Amós, foi chamado por Deus; O Senhor o tirou do ofício de boieiro, e o mandou profetizar para Israel. Nos (vs-16,17), observamos, que sua emancipação, das formalidades proféticas institucionais, o possibilitou a profetizar com liberdade aquilo que Deus, lhe mandava; Livre de condicionamentos da corte, ou do clero. É interessante, como Deus, escolhe muitas vezes, para a realização de uma determinada missão; Talvez um camponês para uma mensagem, contra a imoralidade, socialmente se justificasse; Mais para uma mensagem voltada para a injustiça Social, e diretamente para as classes dominantes; Ai já não tem. Claro, para mentes ideologizadas, como a de Amazias. Deus, escolhe alguém estratégico, para levar a sua palavra, num contexto, marcado pela injustiça Social; De acúmulo(Am-3:10), de suborno da administração da justiça(Am-5:12), De controle do comércio(Am-8:4-6), Religião institucionalizada para mascarar a injustiça(Am-7:12,13), de conluio entre os que detém o poder econômico, político e jurídico; Logo, a opressão do pobre e dos mais fracos. Amós, destemidamente anuncia o fim de Israel, por seus ricos oprimirem os pobres, e os poderosos manobrarem a justiça e o direito; Assim como também, anuncia o desmantelo e a vergonha da religião legitimadora da injustiça Social(Am-7:17). Amós, em sua crítica social, denuncia, os corrúptos, mais foca mais no sistema, na estrutura que gera pessoas corrúptas. Ele entende que a causa fundamental, da corrupção tem haver com estruturas politico-culturais e religiosa, motivada por interesses econômicos. Contra esta corrente Amós, se posiciona dizendo: "Odeiem o mal, e amem o bem".(Am-5:15). 

       No Novo Testamento, principalmente através do ministério de Jesus, percebemos o valor da justiça Social. O ministério de Jesus, se dar num contexto, marcado pela injustiça Social. Numa cultura greco-romana, e sob o império Romano, Jesus, levava as boas novas. Os poderosos cobravam pesados impostos do povo, que na maioria era de camponeses; Para a ostentação do império. Por causa disto a vida do povo era precária e dura. A religião era conveniente, e também tinha suas taxas. O povo refletia e muito o modelo cultural do império, em seu comportamento; Este era pouco solidário e aceitava a injustiça. Jesus, em seu ministério, contraria tudo isto, com seu ensino sobre solidariedade e justiça social. Ele foi crítico para com a riqueza não compartilhada, mais fruto da avareza(Lc-12:13-21). Ele ver numa riqueza não compartilhada, loucura e não sabedoria. É no ser rico para com Deus, que está a sabedoria dizia ele. Ele se apresenta no novo testamento, como aquele que veio para anunciar as boas novas, aos pobres, aos oprimidos, aos marginalizados(Lc-4:16-19). Na visão de Jesus, aqueles que querem trilhar o caminho do Reino, devem ser capazes de ter uma autocompreensão do que seja ser justo(Lc-12:57). Para Jesus, um bom julgamento da vida, das coisas do reino requer uma visão espiritual. Os fariseus, por causa de suas mentes e corações endurecidos pelo pecado; Interesse próprio, justiça própria, não conseguiam entender do que Jesus, estava falando. Bastava que eles realmente fossem justos acerca dos sinais que Jesus, fazia, para entender o tempo do reino de Deus; Mais eles eram carnais, interesseiros, indiferentes ao tempo de oportunidades, em que viviam, para se arrependerem e reconciliar-se com Deus. Sim na visão de Jesus, a vida comunitária, a vida Social, para que nela haja solidariedade, justiça social, é preciso que cada um que faz esta comunidade saiba julgar(Jo-7:24). É comum nós julgarmos os outros, segundo os nossos interesses, segundo a aparência; É comum a injustiça Social como vício. Jesus, sentiu isto na pele; Foi caluniado, desclassificado, desqualificado. Por que?. Por falta de consciência daqueles que o julgaram mal. Faltou consciência e autoconsciência. Faltou objetividade. Faltou a reta justiça. É difícil não ter alguém que não seja culpado de ter cometido injustiça, por errar no seu julgamento para com o outro; São muitos os injustiçados por julgamentos errados. Como discípulos de Jesus, precisamos ter habilidade para julgarmos o outro, sob pena de cometer uma injustiça. Em (Jo-7:20), percebemos que Jesus, foi demonizado, pela coletividade; Ou seja, uma multidão emitiu a idéia de que Jesus, estaria endemoniado; O que é um equívoco coletivo. Mais o que está por trás, de tamanho equívoco?. Seria uma multidão consciente, ou influenciada para pensar assim?. Ideias acerca dos outros podem ser mera fabricação.

          Analisando uma possível vontade de justiça Social, no atual contexto, a complexidade do ser justo, do fazer justiça, no antigo e novo testamento, a fala de Jesus, sobre as implicações para quem deseja ser justo, não pude fugir do idealismo de Hegel. Por que?. Porque até, quem desdenha deste, é mais idealista, do que o confesso. É razão, a partir de uma centralidade da subjetividade. Ou centralidade do eu. A relação com o outro, é sempre relação sujeito-objeto. É sempre relação que objetiva condicionar o outro. Nas relações, inclusive na coletiva, social; Hoje mais do que nunca, a centralidade da subjetividade, do eu; Depois de muito tempo desta fala de Hegel, esta subjetividade do sujeito, na apreensão do objeto; Seja saber, seja instituição, seja o social, seja o homem; É mais forte do que nunca. A consciência que se pode ter do outro como objeto, é a consciência do que ele “representa”, para o sujeito da relação. É uma apreensão subjetiva; O sujeito imprime a sua subjetividade, no outro, que está sob sua consciência. Em Hegel, para uma objetividade do conhecimento, é preciso consciência da consciência; Ou seja, não está na apreensão do objeto em si; Da forma como ele é, como ele aparece; Mais através de uma autoconsciência. Ou seja, é preciso ter consciência de si. É preciso saber o que leva apreender o objeto, de tal forma, ou de tal maneira. Nesta concepção, o coletivo é o encontro dos sujeitos, com percepções diferente, que lutam por reconhecimento; Gerando assim um problema, que  só pode ser solucionado assumindo um ponto de vista objetivo; Julgando imparcialmente seu próprio ponto de vista; Autoconsciência.  Em Sartre, a relação sujeito-objeto, é necessária, quando nesta relação; Sujeito e objeto, se revezam; Se reconhecem como sujeitos; Outrora como objetos. Mais a relação é dominadora quando alguém se fixa como sujeito; E claro para isto, se abre  mão da solidariedade e da justiça, para lançar mão de ardis perversos. Tanto na perspectiva de Hegel, quanto na de Sartre, a relação com o outro objetiva de certa forma parasitar o outro; E a técnica é uma linguagem que cria dependência, que explora naturalmente o outro. Logo, como nossa teologia pode ser libertadora, num contexto, onde o sujeito da relação; seja o homem, seja a Igreja, seja a Instituição tal, imprime no então objeto, o seu eu, sua subjetividade, sua vontade?. Eu diria em primeiro lugar, que uma teologia libertadora, é contextual, é local. Ela nasce a partir de necessidades do contexto; Mais atualmente, geralmente, esta é incorporada ao contexto, por sua fama; Ou seja, aquela que deu certo em algum outro contexto, talvez até como palavra de Deus, para tal realidade; Dai reconhecimento e fama; Esta passa a ser buscada por vários outros contextos; que passa a ser um tipo de teologia-ideologia. Uma destas teologias, que ainda está na vitrine hoje, é a chamada teologia da prosperidade. Uma teologia assumida apenas por sua funcionalidade em outro contexto; Ou seja, por sua fama, pode até funcionar, atrair as multidões, mais dificilmente esta estará comprometida com a solidariedade e a justiça, tendo em vista, que o senso de justiça exige diante de tal subjetividade, consciência e autoconsciência. Sem autoconsciência dificilmente se enxergará os objetivos de tal teologia; Sua manipulação, sua dominação e consequentemente opressão; Mais apenas sua funcionalidade, seu pragmatismo; Entenda, eu estou falando que, em meio a tudo isto, há uma vontade de justiça, por parte de Deus. Em segundo lugar, uma teologia libertadora, deve ter o Cristo como central. Não quero aqui negar o valor do pragmatismo teológico, fruto primeiramente, de um certo desuso da razão dedutiva. Aquela razão fundamentada apenas no discurso, teorética; Mãe do conservadorismo e de muitos dogmas. Fruto também da demanda da Cidade grande, da megalópole. Mais o pragmatismo muito tem contribuído para uma teologia sem a centralidade do Cristo. Sim, este que propiciou a Igreja, do Deus vivo. A Igreja viva, corpo, onde Cristo é o próprio cabeça. O resultado de uma teologia sem a centralidade de Jesus, é uma Igreja, sem solidariedade, fria no amor ao próximo. O resultado é uma Igreja, profissionalizada para fazer, mais não para servir com responsabilidade. A falta de centralidade de Jesus, na  teologia, faz com que a causa do evangelho, não seja vista como missão, mais em muitos casos, como uma estratégia humana, em benefício próprio. O pragmatismo valoriza acima de tudo aquilo que funciona, que trás resultados. Ele em muitos casos, não leva em conta o que é certo, o que é princípio. Dai muitas vezes passar por cima de princípios fundamentais. A centralidade de Jesus, na teologia, trará o amor para o centro, o serviço como responsabilidade, para o centro.

          Então, a vontade de justiça de Deus, é um sinal do Reino de Deus; A vontade de Deus, é que andemos pelas veredas da justiça; Mais andar por este caminho implica muitas vezes andar longe dos holofotes; Implica ser perseguido. No atual contexto sociopolítico, é preciso se posicionar. Em um contexto parecido com o nosso, Isaias se posicionou a favor da justiça, Amós se posicionou a favor da justiça.

                                                                               Roberto Mota.

                                             

         

 




quinta-feira, 20 de novembro de 2014

"A ARTIMANHA DA CULTURA".

      

Pensando um pouco sobre o sujeito integrado de Adorno, percebemos que este é passivo numa relação mais objetiva; Ou seja, numa relação com o “sistema”, com o meio cultural. O padrão o condiciona, o coisifica. Ele é inevitavelmente influenciado pelo meio; Ele valora condicionalmente, os valores que o grupo defende. Vendo isto por uma relação sujeito-objeto, na perspectiva de Sartre, que ver nesta relação uma necessidade, tendo em vista, que o ser, não é nada sem o outro; Nesta relação, entretanto,  sujeito e objeto se revezam; Ou seja, existe a possibilidade do rompimento com o condicionamento cultural. Aquele de um sujeito ativo fixo sobre um objeto passivo. Nesta relação, o cultural como artimanha pode sucumbir, diante da necessidade de não se ser sem o outro. Mais num mundo, pós-moderno, onde a centralidade da subjetividade, do eu, impera; Como disse o próprio Hegel; A consciência não é suficiente, para tal rompimento; É preciso autoconsciência. É preciso saber o porque do nosso pensar, do nosso comportar-se, do nosso agir.

domingo, 31 de agosto de 2014

"PE. MANFREDO, ENTREVISTA REVELATIVA ".



Um dos principais nomes da filosofia no País, o padre Manfredo Oliveira se tornou referência internacional em estudos sobre ética. Ao aliar lógica e fé, ele defende que a crença em Deus parte da razão


Pe. Manfredo é cearense de Limoeiro do Norte. Pe. Manfredo é cearense de Limoeiro do Norte.
Viagens, só uma vez por mês. Mas nem sempre dá para cumprir a recomendação médica: os convites para palestras e conferências nas mais diversas universidades, tanto no Brasil como no exterior, muitas vezes ultrapassam essa cota para o cearense Manfredo Oliveira, 68 anos, cuja trajetória e obra o tornaram um dos mais renomados filósofos brasileiros da atualidade.

Nascido em Limoeiro do Norte, Manfredo ultrapassou cedo as fronteiras do sertão cearense pelo acesso lá mesmo a diferentes idiomas, latim, grego, francês e inglês, ``coisa que hoje não existe mais em lugar nenhum``, como ele mesmo enfatiza. Pelas mãos da religião, ele chegou à filosofia, onde, na Alemanha, viveu todas as mudanças culturais de 1968 enquanto buscava respostas sobre a razão humana. E, pelo caminho da filosofia, retornou ao Ceará, mesmo ainda sem condições ideais de trabalho e tendo convites para lecionar nos mais importantes ambientes de estudo filosófico do País, por acreditar que tinha uma missão a cumprir em sua terra natal.

É na síntese entre a razão e a fé que o filósofo, que também é padre, acredita estar a melhor explicação para o sentido da vida. Nas lembranças de sua própria trajetória e nas falas de diversos filósofos consagrados, Manfredo trouxe à luz, nesta entrevista dada ao O POVO na última quarta-feira, algumas de suas opiniões sobre a relação entre filosofia e fé, sobre os rumos da Igreja e sobre a política. Leia a seguir os principais trechos:

O senhor é considerado uma sumidade intelectual. Ficar no Ceará foi uma opção pessoal?

Já naquela época eu tinha a ideia de que o intelectual, de alguma forma, tem que contribuir com a sociedade como um todo. As desigualdades regionais no Brasil são enormes e eu me via comprometido.

Como foi sair de Limoeiro do Norte e se deparar com uma realidade tão distinta como a da Alemanha?

Embora eu tenha chegado à Alemanha depois de ter passado quatro anos na Itália, o choque foi muito forte. Choque cultural. Dei um prazo de três meses para mim. Se eu não entrasse naquele mundo, eu desistiria. Por coincidência, o terceiro mês era Natal. Eu fui passar com uma família e nesse momento eu comecei a ver que, mesmo com todas as diferenças, estamos no mesmo quadro da cultura ocidental. É só uma outra maneira de ser ocidental.

Existe, na sua formação intelectual, alguma influência do contato com sua cidade natal?

Eu não saberia te dizer. Eu sempre fui uma pessoa meio estranha ao contexto. Desde muito cedo, botaram na cabeça que eu tinha vocação para o estudo. Tinha na família nomes que se destacaram. Lauro de Oliveira Lima é meu primo legítimo. Diatahy Bezerra de Menezes é meu primo. Havia um certo contexto. Meu irmão mais velho era professor de Engenharia na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Eu fiquei um animal estudante, de forma que não houve aquele enraizamento ao Limoeiro. Claro que você não perde suas raízes. Mas hoje eu sou um ilustre desconhecido em Limoeiro.

Hoje seria viável um estudante de Limoeiro chegar ao patamar que o senhor chegou?

Eu não tive uma formação de Limoeiro. Por quê? Porque eu entrei no seminário. No seminário de Limoeiro era a formação de padres holandeses. Se não fosse isso, eu não teria condições de fazer um doutorado na Alemanha. Por exemplo, na universidade de Munique, para o doutorado em Filosofia, se exigia três exames em latim e três em grego. Onde eu ia encontrar isso, se não tivesse sido no seminário? Da formação básica, eu acho que não existe mais isso em Limoeiro. É uma coisa diferente. Nós traduzimos toda a literatura clássica grega e latina, por escrito. No último ano, nós falávamos em inglês na sala de aula. Em canto nenhum mais do Brasil você encontra isso, não só em Limoeiro. Eu sou dinossauro, absolutamente dinossauro. Pertenço a uma raça que não existe mais (risos).

O senhor sofreu muito preconceito por ser latino na Europa e por ser um filósofo nordestino no Brasil?

Ah, sim. Ainda existe preconceito nos dias de hoje. Existe uma luta para encontrar um lugar. Hoje, eu não sou famoso, mas sou pelo menos respeitado. Para isso, se fez necessário uma luta pela profissão. A ideia é que, de uma certa fronteira para cima, não existem mais mentes, filosofia, pensamento. Infelizmente isso acontece. Não só como latino, mas por vir de um país, naquela época, chamado de subdesenvolvido. Havia exemplos concretos, não era puro preconceito. Quando eu cheguei à Alemanha, havia um colega que estava há 16 anos tentando terminar um doutorado. A partir de exemplos, eles diziam que era uma coisa alta demais para um latino-americano. Para mim, isso constituiu um estímulo. Nosso problema não é falta de avanço civilizatório. Nosso problema é de desigualdade social gigantesca. Temos uma sociedade cindida ao meio. Quando eu recebia aqui amigos da Europa ou dos Estados Unidos, eu fazia questão de fazer uma viagem rápida da Aldeota ao Lagamar. E eles diziam: ``a gente saiu da Virgínia para Bangladesh?``. Isso é o Brasil.

Como o senhor avalia a migração intelectual no País?

Veja bem, com esse problema eu já me deparei quando estava na Alemanha. Naquela época, existia a migração para os Estados Unidos, inclusive de filósofos. Os americanos foram muito sabidos, contrataram os filósofos europeus e também talentos de outras carreiras. Essa coisa é muito trágica. Isso me fez ficar aqui. Geralmente nas regiões onde mais há necessidade, o pessoal, por causa das condições de trabalho, resolve migrar. No nosso caso, há ainda um complexo de subdesenvolvimento muito arraigado inclusive na imprensa. Tudo que é de fora é chique e é bom. O daqui é relativamente problemático. Isso faz parte do povo. Uma falta de auto-estima que caracteriza regiões pouco desenvolvidas. Vocês me perguntam: eu, com essa formação, o que você faz aqui? No caso da Filosofia, eu sempre lembro no caso do (Immanuel) Kant. Ele morava no lugar mais afastado possível. Ele foi o filósofo mais importante do século XVIII na Alemanha, vivendo na extrema periferia, na Prússia Oriental. Se é pra ter valor, precisa mostrar que tem valor, não precisa morar aqui ou acolá.

Como é, para um filósofo que trabalha autores que questionam até a existência de Deus, ser também padre, seguindo dogmas da religião? É um paradoxo?

Nenhum. Claro que talvez as religiões no mundo inteiro nunca tenham passado por uma crise tão profunda como hoje, porque é o sentido mesmo da religião que está em jogo, numa sociedade técnica-científica. Mas aí é que tá, é (um paradoxo) na medida que você considera o conhecimento científico o único conhecimento possível e sério na vida humana. Ora, essa afirmação não é mais científica, já está num outro nível, dogmático inclusive, porque você parte a priori. Agora, em relação especificamente à questão de Deus, eu defendo a tese que essa não é uma questão religiosa, é em primeiro lugar uma questão de razão humana. Agora, nesse sentido, as reações são ótimas. Uma vez o Sérgio Paulo Rouanet veio aqui lançar um livro meu, e pediu uma reuniãozinha com os professores. E naquela época estava muito em jogo a discussão sobre a pós-modernidade, e o Rouanet é um obsessivo defensor da modernidade, e eu, muito jeitosamente, fui falar de um jeito que os pós-modernos (não achassem ruim), pois já sabia que ele tinha falado de um jeito que tinha deixado o pessoal furioso na Faculdade de Direito. Aí, no dia seguinte, o Diatahy foi de uma falta de cortesia imensa: ele virou para o Sérgio e disse assim: ``olha, em primeiro lugar eu gostaria de me congratular com o meu primo, porque defendeu aqui coisas absolutamente fundamentais contra o Sérgio Paulo, que foi uma coisa terrível, um negócio inaceitável e insuportável``, e o Sérgio disse assim: ``olha, eu não vejo muita diferença da minha posição para o Manfredo, apenas ele é mais competente``, (e o Diatahy completou) ``Mas tem um problema, o Manfredo tem a cabeça dividida ao meio, para um lado é um homem inteligente, por outro lado faz parte de uma igreja estúpida, de um papa absurdo``. Eu não vejo nenhum problema nisso. Evidentemente que isso não significa dizer que eu aceito tudo e fico caladinho, mas significa dizer que eu tenho que contar com a finitude, a imperfeição e a limitação (das pessoas que fazem a igreja) e ser alguém vigilante para guardar a fidelidade ao grande horizonte.

Está havendo uma guinada conservadora na Igreja?

Não é de hoje. Quando o João Paulo foi eleito, para mim isso já ia acontecer. Eu trabalhei durante três anos numa paróquia lá em Munique onde os poloneses tinham uma missa, e você imagina que depois de anos do Concílio Ecumênico II eles continuaram celebrando em latim. A missa deles vinha logo depois da minha, eu celebrava em alemão e logo depois vinha a deles em latim. O catolicismo polonês era uma espécie de refúgio de defesa cultural. Como eles se sentiam constrangidos e o socialismo real não teve um mínimo de tato para trabalhar o problema da religião, então a religião contribuiu como uma enorme força de resistência. Eu sabia que por causa exatamente dessa situação o catolicismo dos países do leste europeu era extremamente conservador, ele se conservava nas coisas tradicionais. E isso não sai da cabeça do papa Bento XVI, de alguma forma ele continua com essa história, embora saiba, claro, que vive num país extremamente moderno, e que a religião católica jamais voltará a ser aquele tipo de grupo que vai tutelar uma sociedade como um todo.

Essa visão conservadora aumenta a crise da religião?

Para a juventude, sim. Na realidade, os países que se dizem cristãos na Europa não são mais cristãos, virou uma sociedade extremamente materializada e é esse o drama do papa. A religião deixou de ser fundamental na vida das pessoas, e como recuperar isso? A posição dos tradicionalistas é a volta à Igreja do passado, que tinha convicções e nada de grandes discussões. Assim você tem as ovelhinhas todas controladas pelo pastor, e o clericalismo volta com toda força. Essa é a solução deles para a crise da religião. E isso é muito difícil a meu ver, porque mesmo as ovelhinhas queridas não são mais tão ovelhinhas assim.

Tem questões desse conservadorismo que extrapolam a Igreja e afetam o restante da sociedade, como a do aborto, a do uso de células tronco.

Eu vejo um mal entendido de ambos os lados. Primeiro, do ponto de vista da Igreja, que não poderia fazer lobbies e tem que reconhecer que vive numa sociedade autônoma. Pode propor, como em qualquer sociedade democrática, coisas que ela ache válidas não por causa da fé, mas por serem coisas humanas. Mas virou uma questão emotiva, ao invés de se tornar uma discussão real. Aborto não é um problema de quem tem religião, é um problema de qualquer ser humano. O que é que eu vou fazer com os embriões? São humanos ou não são humanos? Isso é uma questão que se põe tanto para um ateu como para um crente, e isso poderia permitir uma conversa humana, com critérios humanos em ambos os casos. A Igreja, em relação especificamente ao aborto e aos embriões, parte do princípio que ela não defende uma ideia religiosa, o que é correto, mas uma ideia científica, só que a ciência não tem unanimidade em relação a essas questões. Ela parte como se a teoria que diz que existe embrião desde o momento da concepção fosse a única teoria aceitável, e não é verdade, porque há outros que levantam dúvidas a respeito disso e que são tão cientificamente defensáveis como a primeira. Embora eu, pessoalmente, independente de qualquer fé, ache que é mais plausível que sim, pelas razões apresentadas, mas não tem nada a ver que seja a única. São coisas diferentes. Eu tenho a impressão de que essa se tornou uma discussão impossível.

Diante da crise da religião, que tipo de teologia o senhor acredita que pode aproximá-la dos seres humanos?

Eu acho que a teologia tem que mostrar que o problema que as religiões tentam articular é o problema da resposta às questões mais fundamentais do ser humano. Uma religião hoje precisa ser capaz de falar aos seres humanos nesse sentido último, com uma proposta de resposta às grandes questões sobre o sentido da vida, o que afinal de contas nós temos a fazer nesse mundo, como enfrentar o problema do mal. E isso é uma das coisas que o papa diz com razão, ele diz que o mundo moderno criou coisas fantásticas, e que nós somos orgulhosos disso, mas deixamos em vazio as grandes questões do sentido. Para que essas coisas todas? Qual é o sentido de tudo isso em última instância? Nós estamos aqui para quê? Para onde nós vamos, há algum sentido englobante da vida humana ou o ser humano é uma paixão inútil, como dizia Sartre, cuja vida não tem o menor sentido e por mais que a gente lute, um dia tudo se acaba? Por isso a Igreja tem aqui (na América Latina) muito forte as questões sociais, porque é a vida que está sendo negada, é a dignidade da pessoa humana que está sendo absolutamente ameaçada, é a natureza que está sendo desrespeitada no seu ser.

O senhor acha que o enfraquecimento da religião tem levado ao abandono de valores morais na sociedade atual?

É um grande problema. Eu não quero dizer que com isso a religião seja a única fonte da moralidade, de jeito nenhum, ela não é a primeira fonte, ela pode radicalizar, mas a primeira fonte é o próprio ser humano, a sua vida, as suas questões, é aí que ele reflete sobre valores. Agora, o grande problema é a motivação para a realização de valores éticos, porque a religião é uma motivação muito forte, aliás Hegel dizia isso. Ele dizia ``a modernidade tem razão quando procura uma moral autônoma, isto é, independente da religião, construída a partir da razão humana. Mas esqueceu que o ser humano não é só a capacidade de elaborar uma moral, ele precisa de motivações para agir, e a motivação religiosa é uma motivação enorme. Porque ela engloba a vida toda``.

Ao falar da questão da moralidade, não dá para deixar de pensar na política, já que diariamente há escândalos.

Eu acho que essa discussão, por um lado, no Brasil é boa, mas por outro tremendamente unilateral, porque ela se concentrou nas ações individuais. Quer dizer, há políticos corruptos. Mas nunca se pensou com seriedade as estruturas políticas que tornam isso possível. Da forma como estão organizadas, por exemplo, as eleições no Brasil, é quase impossível não ter um caixa dois. Um frade beneditino candidato teria que fazer caixa dois, porque essa história do financiamento privado das campanhas, a não existência de partidos... Então esse é o elemento estrutural que devia ser atacado por uma reforma política, e quem fala isso? A estruturação política brasileira é toda apta a possibilitar corrupção.

O senhor já foi filiado a algum partido?

Não, nunca pensei nisso. Eu, pessoalmente, acho que não devo fazer, até porque eu morro de medo de pensamento único. Eu defendo fortemente a ideia de que as igrejas, do ponto de vista político, deveriam ser lugares onde se poderia discutir livremente propostas diferenciadas. Eu me lembro que eu tinha uma colega das ciências sociais que de vez em quando me dizia: ``por que é que o partido político da Igreja é o PT?``. Há um perigo aí, porque, se você não votar com esse partido, é porque você é um traidor, você é direita. Isso é um dogmatismo de outra forma. As religiões já correm o perigo sempre, porque tratam do absoluto, de se considerarem absolutas, mas se ainda nas questões puramente técnicas, políticas, de valores e ideologias, você vai criar uma situação de direção única, você vai criar totalitarismos insuportáveis, e é isso que sempre me impressionou muito no socialismo real. Você não podia discordar nem sendo marxista que era tido como persona non grata.

A ciência pode ser ainda mais dogmática que a religião?

Muito mais. Eu conheço um colega professor da Alemanha que uma vez, dando uma conferência em Moscou, fez críticas a Lênin, e um professor russo se levantou e disse: ``como é que o senhor ousa, neste lugar sagrado onde passou Lênin, criticar Lênin?``, e o alemão respondeu com calma ``eu não sabia que aqui tinha lugar sagrado`` (risos). Ironia fina. Quer dizer, essa mentalidade do século XIX, mentalidade dogmática, que é presente ainda muito nas igrejas, é presente também nos movimentos sociais, que surgiram nessa época e que a guardaram sem ter uma experiência democrática. Isso é ruim.

Perfil

Manfredo Araújo de Oliveira, 68, é padre e filósofo com mestrado em teologia pela Pontifícia Universidade Católica Gregoriana de Roma e doutorado pela Universidade München Ludwig Maximilian de Munique, na Alemanha. Tem 22 livros publicados, entre eles Ética e Sociabilidade (Loyola, 1997) e Dialética Hoje - Lógica, Metafísica e Historicidade (Loyola, 2004), além de dezenas de artigos que integram outras publicações. É professor titular do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC), presidente da Fundação Marcos de Bruin e ministra missas aos domingos na igreja Nossa Senhora da Saúde, no Mucuripe.

Logo ao iniciar a entrevista, Manfredo desligou o celular, no que levou os repórteres a fazerem o mesmo.

Ele se aposentou da UFC, mas continua a lecionar como professor voluntário e este semestre terá disciplinas.

O curso de Filosofia da Universidade Federal do Ceará teve uma trajetória às avessas: iniciou com um mestrado e só depois a graduação. Agora luta pelo doutorado.

Além das aulas, Manfredo atua no Lagamar, na Fundação Marcos de Bruin.
Fundada em 1992 pelas comunidades eclesiais de base, a fundação dá apoio a crianças, jovens e adultos, especialmente para a formação profissional.

Manfredo já foi regente de cantochão e gosta muito de cantar nas missas que reza todo domingo na igreja de Nossa Senhora da Saúde, no Mucuripe.

Fonte: Jornal O Povo; De 2010.

domingo, 20 de julho de 2014

" A SÍNDROME DE NAZARÉ".[Mc-6:1-6].

INTRODUÇÃO: Neste texto, ocorre um fenômeno estranho diante da aparição do Messias, e não mais do Jesus, filho de José e de Maria. O bem, feito ali em sua comunidade, causa admiração, mais ao mesmo tempo escândalo. A origem de Jesus, culturalmente o descredencia como Messias. Gosto de chamar este fenômeno de síndrome de Nazaré.

1- SOBRE ESTA SÍNDROME.

1-1-É aquela visão de Cidade pequena.
  • Nazaré no contexto de Jesus, tinha de 480 a 2.000 pessoas como habitantes
1-2-É aquela visão que quer privilegiar uma família só, em detrimento das outras.
  • Alguns queriam privilegiar a família de Jesus, em seu ministério.(Mc-3:31-35).
1-3-É aquela, onde aquele que é chamado, não é muito crido pela família.
  • Como Messias, Jesus, também teve dificuldade de ser crido, entre os seus.
1-4-É aquela visão que dogmatiza o básico.
  • Gera preconceito com o novo
  • Marginaliza o progresso.
  • Mistura as coisas.
2-ROMPENDO COM A SÍNDROME.

2-1-Alargando a visão.
  • Evoluindo de uma visão mais rural, para uma visão mais urbana
  • Jesus, estrategicamente saiu de Nazaré, para iniciar seu ministério
  • Só depois de estabelecer seu ministério, volta a Nazaré, impossibilitando a síndrome de contaminar o seu ministério.
2-2-Confrontando a síndrome com a vontade de Deus.
  • No Reino de Deus, privilegiado é aquele que faz a vontade de Deus.
  • Disse Jesus:"Minha mãe e meus irmãos, são aqueles que fazem a vontade de Deus".(Mc-3:34,35).
  • Precisamos confrontar todo aspecto que seja cultural; Quando este é obstáculo a vontade de Deus.
2-3-Colocando aquele que é chamado como cria do céu.[Is-61:1-3;Lc-4:16-19].
  • Jesus, abriu o livro da lei, e disse de quem ele se tratava.
  • Aquele que tem um chamado, possui acima de tudo em sua existência, um propósito divino e não institucional.
  • Deus, usa as instituições para apoiar e até legitimar alguém chamado por ele; Mais estas não podem entrar em conflito com o propósito divino.
  • Talvez experimentemos em nossos dias em alguns casos, um conflito teleológico, entre o propósito de Deus, e o propósito institucional.
  • Fica claro aqui, a luz deste contexto, que Jesus não era cria da Cidade, não era cria de sua família, ele não era uma cria dos religiosos de seu tempo.
  • Ele não era um tipo de padre Marcelo da existência.
2-4-Encarando o básico como básico.
  • Um grande valor tem as coisas básicas da vida; Como a família, nossa origem Etc.
  • Mais tudo isto deve ser base, para evoluirmos, e nunca nos prender.

CONCLUSÃO: É fato que Nazaré, era uma cidade bem básica; Levava a sério demais os costumes, condicionando o ser e sua individualidade. Esta cultura, bem básica descredencia Jesus, como Messias; Ou seja, ele não foi crido. Dentro daquela cosmovisão, o filho de José, o carpinteiro era pequeno demais para "SER", o Messias. Dai, a síndrome ser a incredulidade gerada pela basicalidade daquela pequena comunidade. Então, tendo em vista, ser impossível evitar esta síndrome, enquanto caminhamos neste mundo; Precisamos rompé-la, afim de não sermos totalmente contaminados por ela. Alarguemos a visão do povo, através de um conhecimento mais pleno; Levemos o povo, o contexto ao entendimento da vontade de Deus, esta é boa e agradável; Respeitando o protocolo sim, mais o propósito do ministério, daquele que é chamado, é divino.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

"UMA TEOLOGIA DA FELICIDADE, É POSSÍVEL".

      Felicidade, o mais elevado bem do mundo contemporâneo. Dela parte a motivação para tudo mais. A busca da felicidade, e o efeito desta na motivação para a vida, nos confunde. Em muitos casos, esta busca tem consequências desagradáveis; Trazem em vez de felicidade, perturbação a existência, a vida. Mais o conceito de felicidade é amplo, é plural.
      Afirmo sim, uma teologia da felicidade, em nosso tempo; Pois afirmando, estou afirmando a vida. A vida vivida com prazer, com gosto. Este tema não é simples, não é banal, mais está em todos os lugares. Falar de felicidade, é se expor, aos felizes e aos infelizes. É não saber, até mesmo por experiência própria, dizer o que é de fato a felicidade. Mais ela é quem motiva os homens a viver com gosto. É quem motiva a sonhar.

sábado, 31 de maio de 2014

DIÁLOGO ENTRE LEONARDO BOFF E BOBBIO; A POSSIBILIDADE DO POBRE COMO SUJEITO



Em razão destes valores, quis honrar esta significação política, fazendo com que a Università degli Studi de Turim, onde era eminente professor, me concedesse, em nome de tantos, o título de doutor honoris causa em política, o que ocorreu no dia 27 de novembro que tive com ele em Turim e, ao mesmo tempo, veio-me um forte sentimento de gratidão por aquilo que nos ajudou a entender da democracia. Em meio ao conflito que nos anos 80 e 90 envolveu a teologia da libertação, foi Bobbio dos poucos pensadores europues que, de imediato, compreendeu a relevância desta teologia para uma democracia como valor universal a ser vivida a partir da base e dos últimos. Captou a relevância política das comunidades eclesiais de base e da leitura popular da Bíbilia porque não apenas criam cristãos militantes mas também agentes de transformação social.
de 1991. Lembro-me que o Vaticano e o Cardeal de Turim pressionaram as autoridades da universidade para que não concedessem este título a um teólogo “maldito”como eu. O Prof. Bobbio protestou com veemência e fez valer a autonomia da universidade.
Foi nesta ocasião que conversamos longamente, no dia antes da cerimônia e no dia após quando participei de um debate público num dos salões da cidade. Arguto, foi ao cerne da questão que interessava a ele e a mim: o sentido singular que nós, téologos da libertação, dávamos aos pobres. A maioria tem dificuldade de entender esta questão e ele a havia captado em sua diferença específica.
Três compreensões de pobre circulam ainda hoje no debate, também quando nos referimos à Fome Zero. A primeira, tradicional, entende o pobre como aquele que não tem. A estratégia então é mobilizar quem tem para ajudar a quem não tem. Em nome disso se organizou, por séculos, vasta assistência. E uma política beneficiente mas não participativa. Não descobriu ainda o potencial dos pobres.
A segunda, a moderna, descobriu o potencial dos pobres e percebeu que não é utilizado. Pela educação e professionalização é utilizado e potenciado, e assim eles são inseridos no processo produtivo. A tarefa do Estado é criar postos de trabalho para esses pobres sociais.
A leitura tradicional vê o pobre mas não percebe seu caráter coletivo. A moderna, descobre-lhe o caráter coletivo mas não apreende seu caráter conflitivo. O pobre é resultado de mecanismos de exploração que o fazem empobrecido, gerando assim grave conflito social. Previamente à sua integração no processo produtivo vigente, dever-se-ia fazer uma crítica do tipo de sociedade que sempre produz e reproduz pobres e excluidos.
A terceira posição, da teologia da libertação, diz: os pobres têm sim potencialidades. Não apenas para engrossarem a força de trabalho, mas principalmente para transformarem o sistema social. Os pobres, conscientizados, organizados por eles mesmos e articulados com outros aliados, podem ser construtores de uma democracia participativa, econômica e social. Esta perspectiva não é nem assistencialista nem progressista. Ela é libertadora.
Ao convergirmos nas idéias, os olhos cansados do mestre brilhavam como os de uma criança. E eu me sentia feliz: o “papa” da política me tirara o exorcismo de “maldito”.
Fonte: www.leonardoboff.com/site/vista/2004/jan16.htm